Desde o Direito Romano justinianeu[1], o nascituro tem sido objeto de codificação e proteção. Devido à sua maior importância, o Direito das Pessoas[2] foi o primeiro a ser tratado no Digesto[3].
Gaio,
jurisconsulto romano, já havia dividido o Direito em pessoas, coisas e ações,
demonstrando o espírito prático do seu povo. Assim, estabeleceu-se que somente
seria pessoa o produto do parto de ser humano, nascido com vida:
D.
50.16.129. (Paulus libro I ad legem Iulian et Papiam). Qui “mortuius” nascuntur, neque nati, neque procreati videntur, quia
nunquam liberi appelari potuerunt (Os que nascem mortos não se consideram
nascidos nem procriados, pois nunca puderam chamar-se filhos).
D.
35.2.9.1. Papiniano. ...partus nodum
editus homo non recte fuisse dicitur (não se diz nascido um homem sem que o
parto tenha havido).
D.
25.4.1.1. Ulpiano. ...partus enim
antequam edatur, mulieris portio est vel viscerum. (antes de ser dada à
luz, a criança é uma porção da mulher ou de suas vísceras).
À primeira
vista pode-se ter a impressão de que os romanos negavam proteção ao nascituro.
Entretanto, Poletti[4] pondera que
as referidas compilações visavam à “proteger a mulher diante da pretensão do
ex-marido de colocá-la sob guarda, tendo em vista estar grávida do filho dele”,
caso contrário a gestante poderia sujeitar-se a tutela perpétua, na condição de
alieni iuris[5].
Corroboram esse
entendimento diversos outros fragmentos do Digesto, os quais conferem proteção
ao filho ainda não nascido diante de interesses contrários aos seus:
D. 1.5.7.
Paulo. ...qui in utero est, perinde ac si
in rebus humanis esset, custoditur, quotiens de commodis ipsius queritur,
quanquam alii, antequam nascutur, nequaquam prosit (aquele que está no
útero é protegido de maneira igual como se estivesse dentre as coisas humanas,
todas as vezes que se questionar de suas próprias vantagens, de maneira que,
antes de nascer, de forma alguma a outro aproveite).
D. 1.5.26. Juliano. Qui in utero
sunt, in toto paene iure civili intelliguntur in rerum natura esse. (Aqueles
que estão no útero, em quase todo o direito civil, são compreendidos como se já
estivessem nascidos).
D.
37.9.1.15. Ulpiano. (...não duvidamos que o pretor deva socorrer também ao que
vai nascer, bem mais porque a sua causa deve ser mais favorecida do que aquela
do menino; pois se favorece ao concebido para que venha à luz, enquanto ao
menino para que seja reconhecido na família; porque o concebido tem que ser
nutrido pois nascerá não somente para o pai, ao qual se diz pertencer, mas
também para a república”).
Também conduz à
mesma conclusão o preceito nasciturus pro
iam nato habetur, quum de eius commodo agitur (o nascituro é considerado
nato, quando estiverem em jogo suas vantagens).
[1]
Compilação e codificação das leis e da Jurisprudência Romana, ordenadas no VII
século da era vulgar, pelo Imperador do Oriente. (POLETTI, Ronaldo, Elementos
de Direito Público e Privado, pg. 25).
[2] D. 1.5.1
(Gaius, Instituionum, libro I) Omne ius, quo utimur, vel ad personas
pertinet, vel ad res, vel ad actiones. (Todo o direito que usamos é
pertinente às pessoas, ou às coisas ou às ações). (POLETTI, Ronaldo, Elementos
de Direito Público e Privado, pg. 73).
[3]
Depois de haver editado o Codex Iustinianus
(529 d.C.), reunião das leges,
concebida por Justiniano desde a época de seu tio Justino (518-527),
adaptando-as à realidade da sua época, o Imperador convocou os homens da maior
competência para uma missão muito mais hercúlea, através da Constituição Deo Auctore, de 15 de dezembro de 530. A Constituição era
dirigida a Triboniano, como quaestor
sacri palatii, que havia se destacado nos trabalhos preparatórios do
Código. Tratava-se de recolher, nos escritos dos juristas antigos providos do ius respondendi, os fragmentos
necessários para levar a cabo um tratado completo daquela parte do direito
ainda vigente que, por pertencer à época clássica, somente podia ser conhecido
pela obra dos prudentes. Os fragmentos deveriam ser organizados. A compilação
resultou no Digesta ou Pandectae, a parte mais importante do
esforço justinianeu, uma vez que reunia a doutrina que haveria de influenciar
todo o mundo futuro, na criação e aprimoramento do Direito. (...) Em 16 de
dezembro de 533, o Digesto foi publicado, integrado por 50 livros, reunidos os
9.142 fragmentos, dos quais, aproximadamente, 1/3 são de autoria de Ulpiano,
sendo que mais de 2/3 foram colhidos nos juristas da Lei de citações (o famoso
tribunal dos mortos), sendo autores de 2.470 fragmentos os juristas Cervídio
Cévola, Pompônio, Juliano, Marciano, Javoleno, Africano (Marcelo), mais 27
juristas escreveram os 535 fragmentos restantes. (POLETTI, Ronaldo, Elementos
de Direito Público e Privado, pgs. 54/55).
[4]
POLETTI, Ronaldo. Elementos de Direito Romano Público e Privado . 1. ed. Brasília: Livraria e Editora
Jurídica, 1996, pg. 76.
[5] La locuzione latina ellittica alieni
iuris veniva utilizzata tecnicamente dai giuristi romani in luogo della più
completa alieni iuris subiectae per indicare le persone che erano soggette al
potere di qualcuno. Contrapposto al concetto di alieni iuris vi era quello di
sui iuris, che stava ad indicare, invece, coloro che non erano soggetti al
potere di altri individui. Il giurista romano Gaio descrive la differenza tra
le due espressioni antitetiche in questi termini: G.1.48 «Sequitur de iure
personarum alia divisio. Nam quaedam personae sui iuris sunt, quaedam alieno
iuri sunt subiectare» (Trad. Segue una ulteriore distinzione sulla condizione
giuridica delle persone. Infatti, alcune persone sono sui iuris, altre sono
soggette ad un potere giuridico altrui. Più in particolare si poteva divenire
alieni iuris: o perché sottoposti alla potestas (patria nel caso dei figli o
dominica nel caso si trattasse di schiavi); o perché sottoposti alla manus (è
il caso delle mogli); ovvero perché sottoposti al mancipium (qualora il pater
familias avesse ceduto una persona a lui sottoposta con l'atto della
mancipatio). Le conseguenze giuridiche per gli alieni iuris erano
particolarmente svantaggiose. Ad essi infatti non spettava alcun diritto nel
campo del ius privatum. Disponível em:
Acesso em: 12 mai. 2010.
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